[GLOSSÁRIO] F de Futebol

FUTEBOL 

 por Augusto de Souza Diana Costa*

Futebol se joga no estádio?

Futebol se joga na praia,

futebol se joga na rua,

futebol se joga na alma.

A bola é a mesma: forma sacra

para craques e pernas-de-pau.

Mesma a volúpia de chutar

na delirante copa-mundo

ou no árido espaço do morro.

São vôos de estátuas súbitas,

desenhos feéricos, bailados

de pés e troncos entrançados.

Instantes lúdicos: flutua

o jogador, gravado no ar

– afinal, o corpo triunfante

da triste lei da gravidade.

Carlos Drummond de Andrade, 1970.

Shiu... No meu futebol não se mexe!

Particularmente desde que me entendo como pessoa na minha família, e acredito que na de vários outros que leem esse texto, sempre houve a máxima de que futebol, política e religião não se discutem. São temas que sempre há um temor em tratar de forma mais séria. Passam por nossas vidas desde o nascimento e é bem improvável que em algum ponto de nossa trajetória não tenha se discutido algum desses temas. Nesse texto vou tratar de futebol para mostrar que mais do que nunca se faz necessário discutir pontos mais duros a respeito do que permeia o meio futebolístico (mas parte disso tudo se aplica também à política e religião).

Desde pequeno, por influência de meu pai, estive presente em rodas de conversas com entusiastas do futebol jogado e tudo que envolve o extra campo do esporte. Era discutido desde trivialidades como a vida noturna dos jogadores até a troca de técnicos e jogadores que ao serem contratados por times rivais ou qualquer outro time são tratados como traidores, como pecadores supremos na religião esportiva. Mas o que vejo hoje, com um olhar mais crítico que o de um jovem inocente, é que o condenável no esporte é sempre deixado de lado e nunca passava pelas bocas de nenhum dos integrantes do papo. 

Fonte: ESPN

O que essa contradição me passa é que gastamos tempo e energia discutindo o dispensável, debatemos sobre a porção mais efêmera do meio esportivo. Será mesmo que futebol não se discute? Ou será que só fomos treinados a sufocar ideias que extrapolam o senso comum diante das contradições das esferas da vida que encontramos na nossa caminhada? Me parece que nos calamos diante de comportamentos que, ao menos, merecem mais seriedade ou são minimamente repreensíveis por fazerem parte do que há de pior na sociedade e no esporte.

E mais do que isso, ao que tudo indica trouxemos a linha de impedimento do futebol para nossas conversas. Se nós a ultrapassarmos, seremos penalizados. É bem comum recebermos objeções logo de cara se tentarmos elaborar mais o discurso. Ignorar ou não falar sobre o espaço do esporte nas nossas vidas coletivas é comum, mas torcer ou chorar sem saber a razão de tanta emoção é comum. E quando se fala de futebol muitas emoções e sentimentos estão envolvidos. E quando uma discussão acalorada de futebol se inicia, o que importa é vencer: no jogo e na discussão. Ninguém quer debater mas todos têm razão. No mínimo curioso, eu diria. 

Fonte: Reprodução/Twitter
Notas
Augusto Diana Costa, de 97. Confuso, intenso, amante, otimista, criativo e terrestre. Confuso nas ideias, intenso em tudo que faço, amante da beleza da vida, otimista mesmo diante de todo o caos e me aterrando há 24 anos. Da Geografia por escolha e (talvez) socialista por essência. nerd, do bar e apreciador da natureza. Graduando no IGC/UFMG, em tempos não pandêmicos pode ser encontrado no laguinho ou no Éden. 
ϕ

Este é o primeiro texto da sessão, organizada por mim, " Quem disse que futebol, religião e política não se discute?", que conta com seis produções de amigos e amigas minhas (Matheus Rodrigues Moreira)

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