Ateliê de escrita | Morangos 🍓

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Em vermelho tom, fruta não nossa. Nunca vi morango no doce feito na roça.

Mas vi na novela. E no programa de culinária.

Então para amanhã teremos torta de morangos a ser servida para o chá da tarde com alguém.

Uma toalha de rosas. Xícaras de porcelana com flor. Chapéu, tempo leve. Conversa, riso.  Temperatura calma.

Chique. 

Morangos são sonhos. E ficam lindo ali, enquanto a vivência do real não permite toalha de rosas com amigos.

Letícia Moraes

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Ultimamente penso em processos. Vou atrás do fenômeno, escavo a terra, exumo histórias, localizo, analiso e percebo. Fiz assim com uma bandeja contendo vinte morangos comprados a seis reais. 

Os mineiros são os maiores produtores de morangos do Brasil. 

O Sr. José, nascido em Sertãozinho, Minas Gerais, mudou-se para Pouso Alegre e lá colhe morangos há 35 anos. No seu casamento não teve bombons de morango. O dólar estava alto.

Mas, quem come morangos?

O Sr. José gostaria de viajar para o litoral em sua lua de mel, mas não pode. No ano em que casara conseguiu apenas três dias de folga, era época de safra. A produção estava em alta, a todo vapor, assim seu patrão necessitou de mais mão-de-obra para a colheita. O morango necessita de cuidado ao ser colhido. O Sr. José é exímio em sua tarefa de colher os morangos. 
 
Mas, quem come morangos? Vocês comem morangos? Quem come morangos? Quem colhe os morangos têm direito a morangos?

Os morangos que eu comi hoje às 09:00 da manhã, enquanto assistia um seminário sobre Educação e inclusão na pandemia, foi colhido pelo filho do Sr. José no mesmo horário há quatro dias, uma segunda-feira.

O filho do Sr. José tem 14 anos. 

Na mesma cidade onde se colhe toneladas de morango, a esposa do Sr. José, auxiliar de limpeza no hospital da cidade, durante seus vinte minutos de intervalo tomou um copo de iogurte industrializado no sabor morango. Ali tinha morangos?

Mas, quem come morangos? Vocês comem morangos? Quem come morangos? Quem colhe os morangos têm direito a morangos?

Morango é  doce, suculento, fresco, aromático, um deleite. Mas, a vida não é um morango

Vocês comem morangos?

Iancey de Lacerda Teixeira


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Alice Bessa

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Doçura, fragilidade, pequenez, cheirinho de creme, gostim do danoninho ... Essas são as primeiras imagens e sensações que me chegam ao pensar em morangos...

Além disso vem a memória de querer fazer florescer um morangim nas minhas terras. 

A primeira etapa consistiu em ver vídeos e ouvir histórias mais sábias sobre quem já havia experimentava fazer brotar morangos na vida.

Depois vem a experiência e as tentativas... O famoso mão na massa... E com isso a frustação, porque mexer com terra meus querides não é fácil. 

Mesmo seguindo todas as etapas nem sempre os frutos aparecem. 

Segue-se a desistência. Por que se há algo que o ser humano não sabe lidar continuamente, são os fracassos. 

E no meio do meu caminho surgiram as melancias, as alfaces, os alhos, os tomates, os abacaxis, os espinafres... 

A gente acaba aprendendo a desviar...

E os morangos? 

Os morangos findaram-se...

Nesse desafio da escrita eu pensei nas minhas práticas com morango e também as minhas vontades.

O que pode ter dado errado nas minhas tentativas de cultivá-lo?

Será o tempo? Será a água? Será o tempero?

Será o humor? Será a mão pesada? Será a falta da cantoria? Será a falta de cuidado? Será falta de rumo? Será a frustação dos erros? 

Será que eu falo de morangos?

Juliana Martins Fonseca

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Morango.

Tão europeu. Melhor seria falar de... mandioca, disse o jovem. Fui pesquisar. Fruta vermelha, de conto de fadas. Mas nasce no arbusto, gramíneo, rasteiro. Fruta vermelha que encosta no chão. Chão frio, hein. Cultivamos no ar. É que a gente não gosta de coisas que se sujam... sujas de terra. Morango, vermelho, frio, sujo de terra e lama. É que choveu, encharcou o campo.

Sujo vem também do veneno. A gente perde terra todos os dias. Faz parte dos desvarios desse mundo. Solos horizontados com matéria orgânica e vida. São descobertos, compactados, carreados pela chuva que não infiltra. Pra plantar, tem que colocar estimulante, pesticida, veneno. Morango sujo de pesticida. Era melhor lama, né?

Se a gente vai falar do gosto do morango devia começar pelo doce ou pelo azedo? Morango vermelho suculento e azedo de pesticida.

Dizem que no Brasil o estado que mais produz morango é Minas Gerais. Nossas serras carcomidas e erodidas regadas a pesticidas que produz no chão rasteiro morangos azedos. Seria esse o sabor do morango?

Sabor, gosto. Me parece que sabor envolve uma história que o gosto desperta. Qual o sabor dos morangos?

Semana passada comprei morangos orgânicos. Só esse nome na frente e o sabor era outro. Imagina comer morangos agroecológicos...

Aline Nogueira

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Os campos de morango da Palestina

Ontem a noite sentei na calçada, enquanto o véu que cobre o último suspiro do céu não se despia. Pensei nas vezes em que brincava descalço, correndo desesperadamente entre uma rua e outra, sem medo dos carros que passavam em velocidades tarturugueças. As ruas de paralelepidos, vertiginosamente enfileirados sem fila geométrica prescrita. Cada passada e trupicão um pedaço de carne a menos. O sangue as vezes escorria como pesadelo. Mas depois de dois ou três trupicões ninguém tem mais medo de arrancar o tampão do dedo. Parado ao sol, meu corpo escaldava e a pele ia tomando tons de vermelho ardido. A pior hora era o banho, quando a água violenta batia nas costas e nas costas da mão, e eu dava pequenos gritos de agonia. Pensei como se não pensasse nada. As memórias que atingem meu corpo, hoje machucado por arranhões, cortes e queimaduras que não consigo cicatrizar. O sangue que corre sem estancamento. A palavra dura, os números quase que em arranha céu que compõem as estatísticas de morte do mundo, que assombram o sono, que hoje já não tenho. Só agora sei. Não, agora sei mais, que gente morre. seria o sentido da minha vida a morte? seria a morte a razão da vida? Percebo que os sonhos já não são mais belos nem as flores florescem sem um certo grau de fadiga. Se isso for o inferno, está perfeito. E quando o galo canta às duas manhã, vejo os funerais atravessando as ruas, e os corpos guardados por sentinelas vestidos como astronautas, dispostos em valas abertas cuja os olhos não conseguem alcançar a distância. Então esse é o sentido da vida mãe? Digo, sem ao menos esperar respostas. Mas recebo, em poucas sílabas atrapalhadas, uma resposta pretérita de páginas manchadas por fumaça de cigarros brancos. “Não esquecer que por enquanto é tempo de morangos”. Os campos de morango da minha terra estão repletos de agrotóxicos, espio ao longe, com ouvidos atentos, tentando encontrar o canto dos pássaros e cricrilar das esperanças, mas não alcanço. O som cessou, as fontes secaram. O outono se anuncia como um canto silencioso. Mas as palavras respostas que recebo não saem da minha cabeça: “não esquecer que por enquanto é tempo de morangos”. Será os morangos das balas vermelhas, suculentas e açucaradas que enfeitam as árvores de natal dos escritórios médicos?  As balas que eu retirava desesperadamente e enfiava na boca e escutava, entre a dureza e a maciez, bater em meus dentes. Os morangos chegaram. É um funeral, mas também é uma festa. O que seria da morte se não resistisse a vida, ainda que às avessas? A morte não é o sentido da vida, pois o contrário. Só morremos por conhecer a vida e vive-la. Triste a vida que temos, governados por burros homens brancos velhos e raquíticos. Bombardeados por mísseis que atravessam os muros para esquartejar pessoas. Mas é a vida, e sem ela, não teríamos como ousar sonhar com os campos de morango. Pois se ainda restar morangos para serem plantados, restará açúcar para melar a boca dos velhos, restará cores para enfeitar as mesas enquanto lá fora, bombas e tiros estão a nos amedrontar. Pensando melhor, agora que o véu se foi, e a noite é presença, nos resta os campos de morango que crescem em meio a aridez do solo bélico colonizado. Colher e plantar morangos no sofrimento de nossos irmãos palestinos é como já dizia Cora: quebrar pedras para plantar flores. Não há esperança nos campos tóxicos do Brasil latifundiário. Mas a esperança nunca dorme nos campos de morango da Faixa de Gaza.

Matheus Rodrigues 

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Morangos, verdes, fritos

Eu gosto de morango. Delícia. Vai bem com brigadeiro. Combina com torta. Morango com chantilly, “nunca vi nem comi”... dizem que com champanhe vai bem. Certo, você bota um leite moça e funciona. Mas não é uma fruta, assim... tesuda. 

É muito certinho. A gente não se lambuza, não faz barulho. No máximo deixa vermelhinho a ponta dos dedos. 

Eu tenho vontade das frutas do calor. Manga... caju.... 

Cheiro forte... Escorre caldo... Faz sujeira... Deixa a boca grudando! 

DELÍCIA

Alegres trópicos

Ivo Venerotti

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