Ventos do passado: nosso NPGEOH em 2020!

"É bizarro como a gente esquece tudo que a gente já fez na vida. 

Tudo que a gente superou, tudo que a gente já fez para chegar onde tá ..."

Bianca Dellafancy

Essa publicação é para as minhas amadas nepegeanas.

Não que, caso não sejas membra ou membro do NPGEOH, não devas ler essa publicação, pois ao contrário. No entanto, talvez o que falo aqui bata mais forte naquelas que, ao longo de 2020, construíram e redescobriram as formas de ser e pensar NPGEOH.

Desde o início de 2020, vínhamos remontando, coletivamente, as peças desse grande mosaico que é esse grupo de pesquisa, estudo, pensamento, diálogo ... e nesse movimento, buscar novas formas para realizar essa construção. Em nossa primeira reunião, no dia 06/03/2020, no Laboratório de Climatologia e Biogeografia do Instituto de Geociências/UFMG, socializamos nossas propostas de trabalho para o ano que se iniciava, organizamos calendários, definimos grupos de estudos, desmembramos o modelo monolítico na qual organizávamos o grupos para nos agrupar em um rizoma de diversas ramificações. Nesse dia, deliberamos uma decisão crucial para a continuidade do grupo: não teríamos mais uma liderança única, nos moldes conhecidos dos grupos de pesquisa cadastrados no CPNQ. Nossa liderança seria compartilhados. Horizontalidades que assustam os olhos e ouvidos dos acostumados com a organização hierárquica da sociedade, que obedecem sem questionar, que apenas executam, como máquinas dispostas a reprodução tecnicista e a exaustão dos corpos.

Entretanto, poucas semanas depois, nos deparamos com a necessidade do isolamento social em razão da pandemia do coronavirus, que hoje, devido às decisões (ou sua falta) genocidas e irresponsáveis dos homens raquíticos que ocupam o governo, deu fim à vida de quase 204 mil pessoas. Foi diante da situação que nos foi colocada que decidimos reorganizar nossos encontros de 2020, e descobrir uma forma outra de ser grupo de pesquisa, agora, de forma virtual. Primeiro, pois entendemos a importância do encontro, de estarmos juntas para partilhamos nossas dificuldades, problemas e inquietações e de construirmos redes de solidariedade. Segundo, pois era preciso que cada uma de nós estivesse disposta a contribuir com ideias, pensamentos, escritos, oficinas e encontros que tencionassem, em nós e naqueles e naquelas que se aproximaram de nós ao longo de 2020, reflexões, esperança, indignação, questionamentos e utopias, para a Geografia e para o Mundo. 

Portanto, cabe lembrarmos, juntas, tudo que fizemos e construímos em 2020. Não para permanecemos em nossos feitos passados, afogando num saudosismo paralisante, mas para dar novos e outros passos.

Todas as primeiras sextas do mês, ao longo dos meses de 2020, realizamos reuniões de trabalho onde discutiamos demandas do grupo, projetos futuros, as agendas mensais, novas propostas de encontros e eventos, além de sempre abrir a roda para falar das inquietações e dos avanços de pesquisa de cada uma de nós. As reuniões de trabalho eram (e espero que continuem sendo) verdadeiros ateliês onde os corpos-pensantes geógrafas, professoras, artesãs se misturavam com as burocracias e obrigatoriedades das datas, das tabelas, do preenchimento das páginas e dos relatórios de pesquisa do CNPQ. Foram nessas reuniões que decidimos pela coordenação compartilhada e gestão horizontal do grupo e também reconstruímos as linhas de pesquisa, que a partir de 2020 passaram a ser: Sabores; Educação; Arte; Gênero e Epistemologia.

Aproveitando o gancho, das linhas de pesquisa surgiram grupos de estudo e trabalho, e projetos de pesquisa. No entanto, é preciso falar que avançamos, enquanto linhas, de formas diferentes, e os resultados que esperávamos alcançar quando surgiram as propostas de criar grupos e projetos de pesquisa para cada linha de pesquisa não foram contemplados em sua plenitudede. Ainda assim, encontros aconteceram, plenos de sabedoria e produção científica, e que foram necessários, no momento, para as membras do grupo. Mais ainda, escritos foram produzidos, e ainda que não se conformaram como projetos de pesquisas, são produções que precisam ser retomadas ao longo desse ano que se inicia. Os restos, que vão se amontoando ao longo de nossas trajetórias. Por isso, acredito ser essa uma de nossas primeiras discussões e obrigações enquanto grupo: fazer o balanço dos trabalhos e encontros produzidos pelas linhas, questionar esse formato dentro da espinha dorsal na qual o grupo vêm se alinhando e propor novos (ou ajustar) caminhos.

Todas as sextas também, mas na terceira semana do mês, nos encontrávamos, remotamente, para uma reunião de estudo, que, também, eram delimitadas pelas linhas de pesquisa, mas orientadas pelos textos do periódico Geograficidade. Retomamos uma prática antiga e fundante do NPGEOH. As discussões dos textos da Geograficidade, recôncavo da produção humanista e fenomenológica brasileira, ocorriam, em meados de 2014 e 2015, no Jardim Mandala, lugarizado da Faculdade de Educação da nossa querida UFMG. Neste ano nos encontramos para falar de corpo, do prazer, do hedonismo, da Terra, da infância e das crianças, o silêncio das mulheres, e de nossos fazeres pedagógicos e políticos em tempos de Ensino Remoto. Espero que nosso grupo dê continuidade a esses encontros tão potentes!

E que alegria que em 2020 podemos nos encontrar diversas vezes, promovendo rodas de conversa internas e com convidadas poderosas, que há tempos queríamos trazer para perto. Primeiro, gostaria de lembrar das vezes que nos encontramos para ouvir uma das nossas falar. Alice e seus diários de bordo; Letícia e o bordado; Roberto e os sabores do Candomblé; Rodrigo e a pichação; Ivo e Espinosa (finalmente); Aline e as fenomenólogas. Além disso, ao longo do ano, sob coordenação de Ivo, nos encontramos para ler e discutir o livro do geógrafo canadense Edward Relph: place and placelessness, traduzido ao longo dos encontros pelo coordenador do grupo de estudos.

Mas além de nós mesmos, contamos com outras convidadas, que nos tensionaram saberes outros do fazer geográfico. Nosso primeiro feat de 2020 foi com a professora Juliana Madalena, da UFJF, que veio discutir conosco o Lugar geopsíquico e a educação geográfica. Depois foi a vez da nossa querida Fernanda Cristina de Paula, professora da Universidade Vale do Rio Doce, abriu a roda para conversármos sobre o tema: "Só me sei sabendo o mundo: geografia e política encarnada". Logo depois chegou Lourance Cristina, culinarista, historiadora e Dra. em Alimentação, Nutrição e Saúde pela UERJ, para falarmos sobre a Cozinha de Santo.  Do fogo que ilumina a vida, Lisa Farias, doutoranda em Geografia pela UNICAMP, acendeu a chama que não se apaga, ao discutir Uma geografia abrasiva e acolhedora. Por fim, nosso último feat do ano foi com a querida Marcia Alves, professora da UFMT, para falarmos da geografia das emoções. 

E por falar em encontros, nosso Diálogos, esse ano completando sua sexta edição, foi realizado nos dias  04 e 05 de dezembro, e contou com 19 apresentações orais, além da palestra proferida pelo maravilhoso Ivo, prata da casa, que nos brindou com uma fala calorosa e emocionante sobre a trajetória do querido professor João Baptista.  Neste ano, além das já tradicionais participações do NPGEOH e do GHUAPO (Grupo de pesquisa Geografia Humanista, Arte e Psicologia Fenomenológica), estendemos o diálogo até Juiz de Fora para trazer pra roda ou querido GHENTE (Geografia Humanista-Ensino-Teoria-Experiência). Com eles também realizamos a primeira Prosa Mineira, um encontro entre os três grupos de Geografia Humanista de Minas Gerais, para nos conhecermos, estreitar laços, alargar os olhares, esquentar o coração.

Das produções acadêmicas não nos esquecemos, e nas revistas e períodicos o NPGEOH marcou presença. Aline nos brindou com dois artigos: Paisagem de Praia e outro intitulado  Praias interiores e a ausência do mar, ambos publicados na revista Geograficidade. Alice, também na revista Geograficidade, publicou o Geografias uterinas: frestas foto-poéticas. Valéria nos presenteou com  a experimentação Paracatu de Baixo: a fotografia de um desastre e com a resenha do livro Por abismos... Casas... Mundos..., de Carlos Eduardo Pontes Galvão Filho, ambas publicadas na revista Geograficidade. Por fim a resenha da nossa querida Virgínia, publicada na Geograficidade, do livro da professora Maria Geralda, intitulado Geografia Cultural, um modo de ver.

Mas se há um espaço fecundo de publicações de nosso grupo é este blog. O blog do NPGEOH nunca foi tão inundado de escritos, fotografias, desabafos, textos acadêmicos, vídeos, poemas, crônicas, delírios. Em 2020, foram criadas as colunas Escritos D'Alice, da nossa poderosa Alice Bessa; as colunas Nossa Geografia Humanista e Em diálogos, tocadas pela maravilhosa Aline Lúcia; a coluna FotoGrafiar, da inigualável Valéria Amorim; as colunas Travessia e Glossário, do delirante Matheus Rodrigues; e por fim, a coluna bordando naturezas, da onírica e rameira Letícia Moraes. Com uma fala especial para a coluna Nossa Geografia Humanista, onde Aline nos apresentou diversas produções de membras e ex membras do NPGEOH. Acreditamos que o blog é um potente espaço de produção e divulgação acadêmica, e despejamos nele nossos fazeres de geografia, educação, arte e ciência. Foi nesse blog que publicizamos nosso polêmico diálogo AcademiaXMundão, que acalorou ânimos, gerou desconfortos, e nos fez repensar tantas coisas, desde nossas formas de dizer, até mesmo a própria Geografia.

Guardo para o final nosso canto de celebração à querida Lívia de Oliveira, que esse ano partiu de encontro a morte. Celebrar Lívia, a pioneira da Geografia Humanista, das pesquisas em educação geográfica, da alfabetização cartográfica e dos sabores geográficos foi uma grande alegria. Uma das muitas mães do pensamento geográfico brasileiro, que nos deixou sua produção poderosa e instigante, mas além disso, plantou em nós a certeza da necessidade da ousadia e da irreverência para a construção do pensamento e da ciência. Foi para Lívia nosso último encontro de 2020, com muitos quitutes e quitandas, com riso e celebração, do jeito que ela gostava.

Vida longa à Geografia e suas geógrafas!

Obrigada a todas, todos e todes que estiveram conosco em 2020. 

Nesse ano que nos propormos à outras formas de ver e viver o mundo enquanto grupo, cientes da urgência de nossa ação e de nosso pensamento, de nosso compromisso com o mundo que nos atravessa, desigual e burramente governado. Mas juntas, construímos pontes de esperança, na certeza que a transformação é possível, ainda que difícil. 

Obrigada NPGEOH, por tudo isso que vocês são!!!

Todo amor! Vamos juntas em 2021!



Comentários

aline nogueira disse…
Excelente retrospectiva! Um ano de muitos desafios e tristezas, mas no qual seguimos juntas. Que respiro! Obrigada!!!
Juliana Fonseca disse…
Eu já aguardo ansiosa os próximos feat de 2021. Que alegria foi poder retornar a esse grupo!!!!

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