Mulheres e plantas: um saber desde o quintal

Na coluna "nossa geografia humanista" de hoje, apresento o trabalho de conclusão de curso de Letícia Moraes, intitulado "As Mulheres e as Plantas – uma ligação ritualística entre o feminino e o todo", apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Ciências Socioambientais pela Universidade Federal de Minas Gerais em 2015.

Letícia Moraes percorre os quintais na comunidade de André do Mato Dentro, localizada em Santa Bárbara - MG, conversando com mulheres sobre plantas e curas. Sussurram nos seus ouvidos e corpo os ensinamentos de Clarissa Pinkola Estes, autora de "Mulheres que correm com lobos" (1994), que se entrelaçam na carne viva e verde desses seres que ela encontra em campo.

Seu trabalho testemunha uma relação orgânica entre mulheres e suas terras, seus quintais habitados por seres potentes e diversos, indicando a necessidade tangente da permanência dessa comunidade frente aos desvarios do capital, aqui explicitado pela urgência minerária.

Salve a Serra do Gandarela! Salve André do Mato Dentro! 💚

A casa, André do Mato Dentro, MG - Fotografia de Letícia Moraes, 2014

Confira um trechinho...


O curar não vem apenas do simples colher e preparar. O que está no entorno destes atos são também elementos de cura. O tratar da planta, a licença do colher, a saudação ao seu elemento curativo e a sua vida. O modo e quando se colhe, a maneira certa de preparar, e toda a dança circular que envolve a curandeira, a planta, a química e o necessitado, são partes fundamentais dessa grande magia. Ao buscar sanar nossas feridas, também buscamos o abraço, a palavra, o aconchego. Nossas feridas mais profundas são curadas pelas palavras, pelo toque. Muitas vezes os remédios nos vêm apenas como um placebo, razão de todo o cuidado no qual fomos envolvidos. 
Para que possamos compreender esse saber das plantas, temos de estar abertas a recebê-las em nosso corpo e espírito. A sensibilidade de cada uma, de cada fase. É uma troca, na qual cada parte dá o melhor de si no que concerne àquilo que possui na cura. Ao ingerir o preparo, bebemos mais do que aquela mistura física. O que realmente cura é invisível aos olhos humanos. Ele é da essência, de cada planta, de cada mulher. Nessa junção podemos afirmar que um fator mais um segundo fator não são iguais a dois. É inifinitude. É ancestralidade; não possui um início determinado. É um saber, que se multiplica, subverte lógicas.


Plantas em André do Mato Dentro, MG - Fotografia de Letícia Moraes, 2014

As plantas que habitam esses quintais

Nos quintais das mulheres de André nos quais estive presente – foram quatro quintaiscasa de imersão sensível - vemos grande variedade de seres. Se dispondo em diversos lugares, cada qual o exato em que se devia estar. Vento, sol, água. Cheiro, cor, movimento. A verdadeira e complexa gama de seres que se movimentam pela luz, para simplesmente ser ali. O caminhar por entre eles exige cuidado e cautela. Todos vivem.
O caminhar por dentro deles exige sensibilidade, toque. Todos vivem.
Cada planta tem sua origem. Habitantes ancestrais da nossa Terra, mais antigas que nós, elas que possibilitam o nosso viver e continuar aqui, neste mundo. “A verdadeira matriz da vida humana é o relvado de que se veste a Mãe Terra”, já bem disseram Toompkins e Bird (1975) na introdução de “A vida secreta das plantas”.
Falando de ancestralidade, origem, procurando saber um pouco mais sobre essas que me encontraram em André, somos levadas para uma volta ao mundo e no tempo. Ásia, Europa, África, América tropical. Chegadas aqui em navios, ou habitantes do Brasil e aqui já usadas há tempos. Se acostumam e se adaptam ao nosso clima, nossas terras, nosso jeito. Descobrem-se seus poderes, seus ser. Relações são despertadas.
De algumas, não se tem certeza sobre sua origem. Como Coração-Magoado e Tansagem, as quais não sabemos ao certo se são originárias da África ou da Ásia. 
Levante, Losna, Orégano e Vique, há dúvidas se vieram da Europa ou da África. Da Alecrim, Alfavaca Cravo, Hortelã, Melissa e a Sálvia, dizem ser do oriente, apenas. O Boldo é africano. Já a Arruda, Artemísia, Artimijo, Camomila, Dente de Leão, Dipirona, Funcho, Marcelinha e Poejo, contam os livros que seus antepassados são de origem européia. O Bálsamo, Confrei, Malva, e o Manjericão Roxo são da Ásia. Do Algodoeiro, há relatos antigos de sua presença no Oriente Médio e nos Incas (Peru).
Das que são mais próximas de onde estamos, a Babosa, o Guaco e o Mentrasto são da América do Sul; a Assa-Peixe e a Gravatá são típicas do nosso Cerrado; Camará, me disseram os livros, ser da América tropical, e o que se sabe sobre a Cana de Macaco, Macela, Maria Gondó, Quebra-Pedra, Sangra d’Água e da Terramicina, é que elas são do Brasil.

Para ler o trabalho completo, acesse aqui!

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