Um cadinho de prosa poética nesses tempos

Fotografia: Valéria Amorim


Parares pandêmicos
Parar...
De volta à casa das paisagens internas. Flano imagético. Quanto é o tempo!
Finalmente o vento entende a língua: poesia. Transpirada solidão das palavras.
Conversam os sutis. Natureza diz nublou em sopros. Na profunda troca o café esfriou.
Parar?
Agora na curva do beco. Medo. Morte assopra.
O alimento balança o bauleto . A entrega. Barriga da esquina de fome grita. Não há ouvidos!
Chão do asfalto molhado. Quentes mãos do cliente. Arte no semáforo.  Janelas fechadas.
Rua da quebrada: rio. Parar seca. Vamos pedir comida hoje, amor?
Parar.
No desemprego, clamando arrego. Sem escolha. Discursos do ódio. Máscaras e máscaras.  Luvas. - Qual doença é a pior? Mastiga a farinha molhada do feijão. O indizível resto do mantimento.
Parar?!
Entocando produtos essenciais. Quanto mais. Produzindo. Inércia rítmica do sistema. Lives com vinhos e queijos. Personal trainer na tela. Coroando a economia, genuína; meritocrática.
Portas abrem e fecham. Filtro monopólico. Cibernético.

Parar: O som do sinal. Dos gritos. Da correção de textos.
Aleita a cria. Barriga. Cicatriz. Corpo marcado. Contracheque invisível. Coito interrompido da greve pelo óbvio. Tremular do giz no quadro.
Pa -rar
Leitura da tragédia. Sonhos.  Tsunami viral. Rebuliço das memórias.
Avesso do conviver.  C’alma. O olhe devagar.  Quem sou.  Verso no rêzo.  Limbo.
Saudade guardada na gaveta que de repente se abriu. Vídeo conferencia sem o espaço do silêncio. Idoso caminha lento. Serena calçada. Cigarro pálido. Lua magenta. Vela. Quedo.

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